Um blog partilhado por Felisbela Fonseca e Nuno Catarino.

20 maio 2004

A vontade maior e a faca

Só tive pena que não tivesses visto... Foi tão lindo! Ele já não se mexia e já não havia sangue. Deixei-o bem enterrado e nunca ninguém vai descobrir. [N]

Nem acredito que o fizeste. Ainda bem. Já tinhamos falado sobre o desperdício de carne não tinhamos? [F]

O assunto está despachado, já ninguém te chateia agora, querida. Já não
vais ser mais perseguida por esse monstro, passeia-te à vontade pelas ruas escuras de Odivelas. A carne humana apodrece tão depressa... [N]

Confessa que nem pensaste, que nem por um instante te negaste à possibilidade de satisfazer esse desejo de sangue. O teu instinto protector foi só uma perfeita desculpa. Senti-te mais quente nessa noite. O sangue humano é tão doce... [F]

Tu pediste-me, tu suplicaste ajuda. Eu faço o que me pedes. Tudo. O sangue é doce, mas o remorso ensombra-me a noite, acompanho-te apenas mais um pouco nesse teu prazer proibido. [N]

Com um brilhozinho nos olhos



"Não dá para contar... mas sei que tu sabes daquilo que sabes que eu sei."

[F]

19 maio 2004

Massa cozida com rebentos de soja

Primeiro coze-se a massa espiral tricolor. Escorre-se a água, juntam-se os rebentos de soja. Acrescenta-se o ovo cozido, cortado aos bocados. Mistura-se tudo com maionese. Acompanha-se com um copo de vinho tinto. [N]

Para a sobremesa gelatina em copos de vidro transparente. Primeiro prepara-se uma gelatina verde ou amarela que é distribuída igualmente por cada um dos copos, só até metade. Quando estiver solidificada prepara-se outra gelatina... esta pode ser vermelha e distribui-se pelos mesmos copos, até cima. Enquanto solidifica é melhor ir comprar uma garrafa de vinho que a última já acabou. [F]

Garrafas há muitas em casa, andamos sempre preparados para nos perdermos nos vapores etílicos. A sobremesa a duas cores é fresca como a noite. [N]

Dá-me só 30m. Tenho que passar por minha casa. Vou tomar só um duche rápido e vestir a blusa verde que sei que vais gostar. Sim, não me esqueço do cd... Acho que vou levar o carro e assim passo pelo Lidl e compro um pão de alho para a entrada. Assim também chego mais depressa. [F]

Pelo pão de alho espero o tempo que tiver de ser. Sim, vem bonita. [N]

Raios, a 2ª circular é sempre um caos a esta hora. Sim, levo o pão. [F]

Deixa o trânsito de lado, liga o Jeff Buckley para voares um bocadinho. Não te preocupes, se chegares atrasada eu espero - o filme é só às dez e meia. Ou esquece o filme e vamos só beber um copo, o jantar foi só uma desculpa pobre que arranjei para te ter comigo esta noite. [N]

Cheguei. Dou-te um toque. É melhor não subir, espero que desças primeiro. A noite está mais quente, o vento parou. O vinho que trazes e os dois copos é quanto basta para fazermos o resto do dia. [F]

18 maio 2004

Please bleed so I know that you are real... so I know that you can feel

E foi assim que deixei o coração no congelador e ainda assim enfeitei a porta branca com fotografias das últimas férias de verão. [F]

Deixaste-me no frigorífico, a arrefecer dessas férias tórridas. A tua pele estava menos queimada que este coração fumegante. Pálido. [N]

Não me sentiste já fria debaixo da pele dourada?... Não me sentiste já menos doce? [F]

Menos doce e mais fria, mas aqueces-me sempre, de cada vez. [N]

Talvez deva descongelar o coração antes de passar o tempo, o tempo de ainda restar a marca do sol na minha pele. [F]

Queimei-me. [N]

17 maio 2004

A minha cama tem saudades tuas

A minha cama tem saudades tuas, deitado no lado esquerdo que é só teu; A minha cama tem saudades do teu corpo quente enroscado no meu, pequeno, de menina, a olhar os teus olhos redondos, negros, onde descanso os meus; A minha cama tem saudades do teu acordar lento, tardio, dessa tua ronha que me dá tempo para preparar gominhos de tangerinas que depois te dou, um a um, entre beijos doces.

(O fim de semana foi assim tão bom?)

O cata-vento não pára de girar. Desde muito cedo que o ouço numa pressa quase desconhecida. Uma ventania dos diabos a entrar pela casa dentro. Na cozinha o vento assobia ao passar pela janela ligeiramente aberta. São 06h00 e não consigo voltar ao sono leve que esta noite me fez sonhar com o mar. Encontrei uma estrela... a tua mão aberta a que chamo estrela do mar. Acho que vou de bicicleta até à praia. Pode ser que o vento ajude.

(A minha cama tem tantas saudades tuas... E tu nunca lá foste.)

Era um dia igual a outros mas numa outra casa. Deixei tudo, tudo o que foi sempre nada porque não chegaste a conhecer. Esperei até perder a vontade. Acho que não me lembro de um vento tão forte, capaz de varrer tudo, tudo. Depois foi só pintar novas paredes. Não me esqueci do cata-vento para não me esquecer que há vento.

(Nunca me deixaste subir quando foi oportuno, chamaste-me quando estava ocupado. Nunca te provei, mas sempre te imaginei condimentada.)

[FF]