Aquela porta aguarda-te, vai lá ter, paspalho
O sono chamava-a mas ela dizia que não, que era cedo, que ainda tinha pelo menos uma boa meia hora de vida para gastar e ele ia-se embora durante mais um pouco. Ela pensava nele, pensava só nele, não pensava em mais nada. Era nas mãos dele que pensava, enquanto escrevia aquelas palavras inúteis que ele nunca iria ler. Nunca. No fundo mesmo ela sabia que o amor é uma forma de nos andarmos a enganar todos uns aos outros, de modo a que de vez em quando nos saia a rifa e seja a nossa vez de sermos felizes. Mas tudo acontece tão rápido, tudo tão breve, tudo tão nulo. Afinal os momentos felizes são só intervalos no tempo permanente de tristeza que nos cobre sempre. Ela andava nisto, até que a campainha tocou , ele entrou, ele aceitou o chá, o café, as bolachas, a televisão, a companhia, a conversa, a vida, aceitou a sua vida e resolveram acabar de alegrias temporárias, dedicaram-se ao sofrimento de vez e ficaram juntos nessa noite e nas outras todas. [NC]