Um blog partilhado por Felisbela Fonseca e Nuno Catarino.

02 fevereiro 2004

Sobre a Falta de Consideração (Para o Fernando Soares)

Não sei o que mais me queimou por dentro. O absurdo da situação abateu-se com mais força por ser tão inesperado. Porque quando, por um momento, se pensa que a bondade pode existir no mundo, alguém nos diz que ela não nos é permitida. Exibem-nos exactos cálculos matemáticos, somas e multiplicações, onde nos mostram que ela não cabe lá, não pode haver espaço para ela. E apaga-se, que ela se vá embora. A esperança vai-se perdendo com coisas destas.
[NC]

Apagou-se. O mal estar às voltas, às voltas... e esta incapacidade estúpida de nos revoltarmos... esta cobardia reprovável! Antes, antes de se poder falar e rebelar e gritar e lutar, antes, antes de se ter tudo lutava-se por pequenos nadas... hoje, agora, todos os dias ficamos, deixamos estar e permitimos que tudo isto exista e cresça assim, a olhos vistos, impune, quase normal. Apagou-se... e ninguém se importa que fique tudo mais escuro.
[FF]

Nesta falta de luz a que chegamos, a capacidade de análise simples fica obscurecida e já nem reparamos na vergonha, que se torna nossa colega. Se num inferno longínquo um anjo perdido se recusar a rachar lenha para as labaredas será renegado? A última, a única hipótese da salvação vai-se no momento em que se abandona. E tudo fica mais triste, tudo mais negro, tudo frio, tudo em raiva por não gritar o que apetece e não se pode, tudo calado no fim.
[NC]

E o silêncio fica... entranha-se. Perdemos tudo, tudo, não há mais nada... e já não há asas que nos levem ao céu.
[FF]