A Sala
O café servido no copo de plástico ferve ainda. Faço o pequeno bocado de plastico transparente que nos dão como colher rodar no copo, misturo o açúcar, espero que arrefeça. Um instante e uma bola cai em cima da mesa, o café entornado. Arreliado, procuro saber quem foi. E vejo-te, então. Já não me lembro do café mas dos dias que passávamos juntos. Quando um professor faltava e íamos à sala dos computadores antigos, onde só nós tinhamos acesso.
A sra. Laurinha, contínua, que nos tinha em boa conta e só a nós dava a chave da salinha que só nós sabíamos. Então passávamos a porta e ligavamos os velhos cpu's. E as horas passavam depressa enquanto jogávamos, incessantemente, o mesmo jogo, Rick Dangerous. Eu era o melhor, a princípio, mas depois também descobriste o truque. Passado um tempo também lá entrou a Joana.
A Joana... Tu falavas com mais com ela. Eu só às vezes, raramente. Não sabia o que dizer. O que se há-de dizer quando não se quer dizer nada, só estar? Às vezes, durante as aulas, enviava-lhe bilhetes. Nada de especial. Contava-lhe da nota do Pedro, da asneira do Tó, do teste de matemática...Bagatelas. Por vezes ela respondia e entao, por dentro, eu explodia. O fascínio que era a Joana, uma rapariga, lá estar connosco. Mas ela entrou na nossa sala e, aos poucos, roubou-nos a atenção ao jogo e o Rick Dangerous ganhou-lhe ciúmes.
Iamos às aulas de religião e moral mesmo com interesse, o professor era um porreiro, nada a ver com aqueles padres chatos de outros anos. Ficávamos na nossa sala a fazer tempo até à aula. Mas depois houve a vez que não foste. Disseste que estavas quase a passar de nível. Demoraste-te e depois nem chegaste a aparecer na aula. Ficaste na sala com a Joana, bem me lembro da saia vermelha que levou nessa quinta feira.
Era primavera mas ela nunca mais respondeu aos meus bilhetes.
[NC]
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