Um blog partilhado por Felisbela Fonseca e Nuno Catarino.

27 janeiro 2004

i-v

i
Entremeai-vos. Ajuntai-vos em lascívia. Eficazmente desordenados mas com sentido, impróprio afinal, mas sentido. Deslocai-vos, pacientes passeantes. Descolorados nessa branquidão toda impassivamente igual. Untai-vos de felicidade até ao rebentamento e por fim voltai. Mas nada me conteis.

ii
Ah, essa inusitada palavra com que me atacas. Não poderias simplesmente guardá-la para logo? Inóspita. Tenho frio e é assim que me aqueces, o calor sim, calorificado quando sinto. Se soubesses da real impossibilidade da inverdade do tempo. Já não acredito na verdade quando és tu quem ma diz. As horas passam mas continuas e então já estou farto desta fraca memória. Despacha-te, antes que a sopa arrefeça.

iii
Jamais havia enunciado tal proposição. No entanto fomos logo por todos apontados - tolos!, como se a verdade fosse nada. E recordo que havia algo mais, sem conseguir, neste tempo todo que passou, focar esse tal. Ignobilmente desfocados, deslocados nessa temporalidade em que à força emergimos. E dos dias que assistimos ao seu passar já mais não os soubemos digerir. Inversos a essa tecnológica aparência continuamos os mesmos. Apenas essa lágrima não conseguiu voltar ao sítio de onde partiu.

iv
Vislumbro agora de relance esse maravilhoso mundo de constantes sim's a que nos reportávamos amiúde. Refúgio de preocupações outras, de facto menores mas quanto mais sentidas... Enfaticamente o mundo era distorcido a nosso favor, sem grande dificuldade. Felicidades tantas, mas então não o sabíamos, claro. Ou então não, já o sabias, e tinhas razão no teu choro conformado que eu não resistia a contrariar. Previsões e antecipações goradas sobrou-nos isto.

v
Inabilmente afundo-me na profundidade clara desses olhos, que se dizem castanhos, mas reflectem antes uma crueldade atroz. Prendem-me e ali me deixam, imóvel. Enredado nessa graciosa luminosidade a ideia de fuga é inútil. E então não resisto mesmo. Resistirá alguém? Benzo-me por ter sido o escolhido no feliz sacrifício que se adivinha. Ajoelho-me uma última vez e agradeço-te ao Amor.
[NC]